São Bernardo de Claraval
Nascido no castelo paterno de Fontaines, na Borgonha, Bernardo foi uma criança simples e reservada, piedosa, tranquila, muito propensa à reflexão. Um dia de Natal, quando era ainda muito novo, recebeu de Jesus sua primeira graça de contemplação. Sua adolescência, protegida pelo céu, escapou a todas as tentações próprias da idade. Então, quando já sonhava fugir do mundo, apresentou-se à sua mente o humilde e pobre mosteiro de Cister, onde poderia, pensava ele, viver ignorado pelos homens – como uma vasilha abandonada: “tamquam vas perditum”. Seus irmãos fizeram todo o possível para que ele desistisse de seu propósito; mas foi ele, Bernardo, quem terminou por levá-los, como a muitos outros, um após o outro. Quando era noviço, meditava sem cessar a frase: “Bernardo, Bernardo? A que vieste?”
De saúde precária, mas de alma forte, trabalhava sem cessar, sem se desculpar em nada, para dominar os sentidos, que são instrumentos que requerem um bom manejo. Desde que fez a descoberta e teve a experiência, cada vez mais doce e mais intensa do amor místico, não se permitiu, senão, o indispensável para a vida comum. Vivia absorto em Deus, até que algumas sensações físicas escapavam-se de sua consciência. Por efeito da graça e de uma natureza mansa, por meio de um exercício espiritual intenso, sua obediência e seu espírito de superação, não descansava em seus combates para dominar seu corpo com vigílias e jejuns, dos quais jamais se dispensava. Assim foram os inícios de sua vida monástica. Desejava ardentemente a vida comum, recusava quantos alívios se lhe ofereciam, bons, pensava ele, para os mais velhos monges, porém não para quem buscava com ardor de noviço a prática íntegra da Regra. As forças não o ajudavam no trabalho, mas ele se entregava às ocupações mais suportáveis, compensando a fadiga com a humildade; em virtude do céu, ele poderia se consagrar a Deus, sem qualquer prejuízo, para se entregar também ao que lhe fora confiado. Durante os intervalos entre o Ofício Divino e o trabalho manual, lia, rezava e meditava sem descanso. A Sagrada Escritura era sua leitura preferida, tratando de acomodar os dons e luzes pessoais à sabedoria dos Santos Padres, a quem recorria com ansiedade e humildade.
A este jovem monge, franzino, alheio aos assuntos do mundo, foi a quem Santo Estêvão, em 1115, colocou à frente dos irmãos destinados à fundação de Claraval. Dedicado a uma contemplação sublime, da qual desfrutara tanto no silêncio quanto na solidão de Cister, agora, ao descer daquelas alturas, exigiu demais da sua fragilidade humana e os confrades se assustaram. Mas a humildade dos discípulos se tornou a mestra do mestre, que sem diminuir sua firmeza e suas exigências, soube fazer-se assim o mais compreensivo dos pais espirituais. Sua maneira de andar, sua aparência, sempre modesta e disciplinada, a sua muito agradável humildade, a sua piedade, a graça que era impossível esconder, inspiravam respeito e veneração; somente sua presença alegrava e edificava. Seu coração estava cheio dos sentimentos mais ternos; ele cultivava com perfeição as santas amizades e nunca abandonou os filhos que mandava para longe; fazendo suas todas as penas que encontravam nos seu caminho. Verdadeiramente, “a graça se havia derramado em seus lábios”, e sua palavra era como uma chama ardente, “ignitum eloquium ejus vehementer“. Dotado de dons excepcionais de coração e de espírito, ele encantava e seduzia. À sombra de seu magistério e de seu exemplo, Claraval chegou a ser prontamente uma escola de vida espiritual, um “auditório” do Espírito Santo. Os postulantes afluiram, as filiações daquele “Vale da Luz” se multiplicaram e o renome do santo abade se espalhou por toda parte.
Requisitado e exigido de todos os lados pelos príncipes, os bispos e o papa, refutava as heresias, defendia os direitos da Igreja e a legitimidade do soberano Pontífice. Bernardo pregou a primeira Cruzada; mas, “utopia de seu século”, “pobre pássaro fora de seu ninho” – como ele mesmo dizia – quando podia, retornava ao seu querido mosteiro. Essa ação apostólica excepcional foi um dos meios usados por Deus para realizar plenamente a missão de Bernardo: desenvolver e conduzir à sua perfeição a milícia espiritual inspirada pelo próprio Deus, ele lançava as redes e a pescaria era abundante. Ele dedicou todo tempo possível à formação espiritual de seus monges, deixando sua doutrina, em numerosos sermões, tratados e cartas. Em seus lábios e em seus escritos, pecado, graça, a Encarnação, a Redenção, Cristo, Maria, a vida monástica, a Regra beneditina, tudo se harmoniza em uma grandiosa síntese: a história trágica do homem, nobre criatura de Deus desfigurada pelo pecado, mas restaurada em sua beleza pela sabedoria Encarnada. A oficina ideal era Claraval; os instrumentos da arte espiritual estão resumidos na Regra. Muito mais do que seus milagres, foi sua doutrina que lhe conduziu tão numerosos discípulos, fervorosos e ilustres.
Sempre dedicado à oração, purificado por uma última doença, depois de ter se dedicado generosamente no árduo e estreito caminho traçado pela Regra, seu corpo não resistiu mais e ele voou em um instante para a exultante eternidade da contemplação divina. Era 20 de agosto de 1153, tinha sessenta e três anos e mais de setecentos monges que choravam em Claraval e em suas abadias filiais. Apóstolo enviado por Deus à Ordem Cisterciense, sua semeadura abarcou e se multiplicou por toda a terra. Contemplativo por excelência gerou por sua contemplação uma multidão de contemplativos. Considerado por seus filhos, durante sua vida, como intérprete do Espírito Santo, São Bernardo é o Doutor da Ordem Cisterciense. Após ter frutificado no seu tempo, não cessa de frutificá-lo; seu exemplo palpita e vive entre nós, possuímos seus ensinamentos e sua intercessão no céu não nos pode faltar.
São Bernardo, Abade de Claraval e Doutor da Igreja.